quinta-feira, 18 de março de 2021

projeto arlequim pt.0: divagando e discorrendo sobre narrativa interativa

já falei aqui no blog antes de narrativa interativa e procedural, é um assunto que adoro e já tentei explorar algumas vezes. esse projeto é a tentativa mais recente e não faço promessas se ele vai ser finalizado, mas tenho mais confiança que vezes anteriores.

um pouco sobre como eu situo esse projeto no campo da narrativa interativa. eu tenho predileção por técnicas que deem mais controle autoral para o algoritmo e eventualmente conheci e me apaixonei pela estrutura das storylets, ou QBN (quality based narrative) conceituada e popularizada pela Failbetter Games, que fez Fallen London. entretanto, gosto da possibilidade que a proceduralidade dá de abrir o leque de ações que são permitidas ao jogador, pois o sistema procedural pode se adaptar e reagir melhor ao impacto causado pelo jogador, inclusive expandindo ele através de ramificações e consequências.

a síntese que eu busquei em projetos passados foi pensar, abstratamente, em um deck narrativo de templates e não narrativas prontas e completas. a melhor técnica procedural para isso acho que são gramáticas de expansão, que permitem o tanto de controle desejado, mas se bem planejadas também podem ser bem abertas.

algo que me atrai muito na estrutura da QBN e na técnica procedural da gramatica é que elas envolvem a escolha constante de "coisas" fechadas e bem definidas. blocos de texto, ou storylets. são métodos para compor blocos de conteúdo (mil perdões por usar esse termo nojento) e apresentá-los ao jogador. falo isso em contraposição a métodos simulacionistas. acho que isso facilita que o designer do sistema qualifique a escolha desses blocos, pelo uso de tags por exemplo. acho muito útil que uma gramática possa me retornar as tags que compõe a estrutura que ela formou e que a QBN possa usar de atributos ou qualidades para decidir o que é possível para o jogador realizar.

esse preâmbulo tentou contextualizar um pouco meu gosto por sistemas narrativos, agora vou falar um pouco mais especificamente sobre o que o influenciou o projeto arlequim.

eu tomei recentemente um gosto muito grande por aspectos idle-game em jogos, em grande parte por conta de tft. gosto da ideia de poder assistir meu jogo e gosto da relação vai e volta que o jogador estabelece com o sistema. também acho muito útil uma estrutura que normaliza que o jogador não tem agencia completa nem pelo que teoricamente são suas próprias peças.

isso tudo institui uma forma interessante de gameplay em que o sistema do jogo pode mexer e reorientar o estado do mundo, para que o jogador tome sua vez tentando organizá-lo do jeito que ele quer, ou chegando perto, e onde o jogador "entrega" algo para o jogo para ver então o que o jogo faz com isso. acho essa forma de jogo muito mais interessante que jogos que são um desafio a ser vencido ou solucionado, mas também jogos "criativos" só que muito abertos, em que o jogo mal reconhece o que você faz.

isso pode virar um jogo em que você tenta montar seu castelinho de lego e o jogo derruba ele para você montar de novo. acho dwarf fortress muito assim e isso realmente não me interessa muito. mas tem uma potencialidade interessante quando você não tem a possibilidade de montar o mesmo castelinho de antes. é mais sobre o jogo te desorientar e você precisar se reorientar depois disso, ou achando outro destino ou tendo que traçar outro caminho.

uma possível solução para isso é simplesmente não dar pro jogador suas próprias pecinhas. permitir que ele impacte o estado do mundo, do mesmo jeito que o sistema em si pode fazer, mas sem nada ser um representativo dele ou posse dele naquele mundo. como um jogo narrativo em que o jogador influencia a história sem ter nenhum personagem para si. já vi projetos assim, mas não joguei nenhum deles.

o jogador não ter exclusividade sobre a agência de um personagem torna menos frustrante o jogo impactar de forma direta aa direção das coisas, mas precisamente porque o jogador se apega menos, o que também não é bom. eu volto aqui para tft, porque acho que a estrutura dele me divertia muito nesse sentido e não me frustrava desse jeito.

tft é um joguinho de luta, não dá para dizer que ele tem muita narrativa no sentido tradicional, mas ele tem a narrativa (no sentido de uma série de eventos que levam um ao outro) da luta, que culmina na conclusão de quem ganhou aquela batalha. quando eu jogava eu sempre sentia que estava montando meu palco, com os lutadores enquanto atores, para depois ver o drama que ia se suceder pela combinação do arranjo que eu montei em conflito com o arranjo que o oponente montou. por isso sempre vi um potencial grande naquilo, você organiza o palco, o setup da cena, o jogo pega a vez de você e te mostra o drama que se desenrola.

um aspecto na estrutura do jogo que me deixava menos frustrada com essa falta de controle é que o momento da sua agência e o momento da agência do sistema são bem demarcados. você tem controle total sob seus personagens em um dado momento e sobre um certo aspecto. você escolhe seus personagens, monta um grupinho e posiciona eles em campo. após isso o sistema toma controle e os personagens agem segundo sua IA. mas ainda que não haja um controle direto constante sob os personagens, existe um momento claro em que eles são seus para brincar e organizar livremente dentro das restrição daquela fase.

acho que essa separação clara entre a rodada em que você pode manipular seus bonecos, sem interferência da IA, e a rodada em que a IA toma controle do drama sem a sua interferência tanto te dá um momento confortável de controle pleno quanto cria um drama intenso na hora de se afastar e ver as conclusões das ações sem poder interferir.

vou deixar para falar sobre o funcionamento específico do jogo depois, porque esse preâmbulo já ficou grande. para resumir isso tudo, comecei a desenvolver o jogo tendo a estrutura QBN e gramáticas de expansão como métodos e pensando na dinâmica básica do jogo como um drama em que você organiza o palco e o sistema toma controle para te mostrar a cena que se desenrola a partir disso.

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